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Eu, Lástima

Opiniões, histórias e desabafos de uma lástima ambulante.

Eu, Lástima

Opiniões, histórias e desabafos de uma lástima ambulante.

Memória raquítica

25.11.20, Lástima

És capaz de não estar preparad@, mas hoje trago uma revelação bombástica acerca da minha pessoa: eu não sou o ser imaculado que aparento. Eu sei, é um choque. Acredito que pensasses que eu não tivesse defeitos e nunca cometesse erros, mas este anjinho não é perfeito e se há coisa depravada que marca a minha existência é a ausência de memória.

Estranho seria se eu dissesse que me lembro de quando me comecei a esquecer das coisas, por isso nem vou por aí. Na verdade, com o andar da carruagem que é a vida, cada vez mais noto que eu, sem o magnífico do meu bloco de notas, não passaria de um rebuliço andante e é graças a ele que sou o serzinho organizado que me orgulho ser. Não obstante, há aspetos corriqueiros que apenas não fazem sentido estar anotados, e é exatamente aí que eu peco.

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TRANQUEI OU NÃO TRANQUEI?

Este episódio é mais repetido do que eu gostaria que fosse. Mas tenho de confessar que já foram inúmeras as vezes em que estou no comboio, sossegadinha e no meu canto, quando, a meio da ponte 25 de abril, sou assombrada pela dúvida de ter ou não trancado o carro. Para aqueles que conduzem um veículo todo modernaço - e refiro-me a todos os carros produzidos depois de 2010 - esta preocupação é quase inexistente. Porém, o meu popó não tranca passado X tempo, de modos que corro sempre o risco de o deixar ao deus-dará.

É um cenário preocupante, eu sei (especialmente se o meu pai estiver a ler isto). Só que o mais curioso no meio disto tudo é que eu deixo o carro sempre trancado e em segurança, apenas não me lembro que o faço e acabo por passar o dia num pranto.

TRINTA BRANCAS POR HORA

Acho que posso afirmar com toda a confiança que todos já tivemos uma branca. Seja num teste, numa apresentação ou numa conversa de café, penso que é um fenómeno que passou por todos. É um pouco incómodo, claro, de forma que só passa despercebido por acontecer tão raramente - isto se tu não fores como eu, cujo dia-a-dia é acompanhado de esquecimentos constantes.

Uma das ocasiões mais frequentes nesta minha vida de pessoa esquecida é em contextos de diálogo. Claro que não é novidade alguém estar a conversar e faltar-lhe aquela palavra que queria mesmo dizer mas dissipou-se. Não tenho muito orgulho nisto, mas é-me bastante frequente estar na ponta de dois espectros completamente distintos: ou repito informação várias vezes porque me esqueço que a disse, ou não digo de todo porque acho que já tinha contado. Eu sei, o meu cérebro mais parece o de uma velhota para cima dos oitentas. Por outro lado, outra coisa que também muito me acontece é quando estou em trabalhos de grupo, especialmente na fase de brainstorming. É que aqui a tua amiga é uma idiota cheia de ideias, sendo parte delas (modéstia à parte) um tanto ou quanto interessantes - só que muitas ficam pelo caminho porque, na hora de as apontar, eu já não sei o que tinha dito. 

No fundo, os meus pensamentos acabam quase sempre por ser entregues às moscas. Porque se não é em casos como os que acabei de exemplificar, é quando estou a divagar nas minhas filosofias de Gustavo Santos ou tenho ideias para o blog, sendo que no momento em que as posso apontar evaporam-se-me. Muitas vezes até construo dissertações super complexas sobre temas que eu considero pertinentes e depois nem uma palavra fica retida no meu cérebro.

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É uma tristeza, concordo. Mas mais triste que isso é mesmo quando eu tenho fome (ou gula, para ser mais sincera), vou ao frigorífico procurar aquela coisa específica para petiscar e, mal abro a porta, deixei de saber o que era. Quase parece que o espírito das dietas se atravessou por mim para tentar combater a minha vontade de comer gorduras processadas.

Por fim, a última situação que tenho para te contar também é mais recorrente do que devia. Já nem sei se é esquecimento, distração ou défice de atenção, porque também me acontece estar no Twitter, por exemplo, lembrar-me que tenho de ir ver não sei o quê ao e-mail e, mal fecho a aplicação, volto a abri-la porque deixei de saber o que raio é que ia fazer no telefone. Estarei assim tão avariada?

Pois bem, não sei se te lembras de quando eu disse ter pseudo-Alzheimer precoce autodiagnosticado, mas acredito que agora consegues perceber que não era um exagero meu. Aliás, com este texto eu nem sei se posso assumir que está terminado. Por mais revisões que faça, vai-me sempre parecer incompleto, visto que até para o escrever sinto que me esqueci de outras coisas sobre as quais me esqueço. Há mais alguém assim na caixinha de comentários ou posso entender que irei ficar só nesta coisa da memória de elefante invertida?

Do Bill Gates aos Simpsons: as teorias mais loucas sobre a COVID-19

18.11.20, Lástima

Eu bem estava a tentar evitar a todo o custo escrever sobre o bicho. Mas parece que ele nunca mais se vai embora e, tendo em conta que não há nada que eu possa fazer para resolver a crise pandémica (além de cumprir as normas e respeitar a etiqueta respiratória), mais vale gozar um pouco com o assunto - quer dizer, não é bem com o vírus em si; é mais sobre algumas teorias loucas que andam a pairar sobre o dito cujo. Resumidamente, esta semana apeteceu-me entrar em modo polígrafo, só que numa versão um niquinho mais mordaz.

"PRENDA" FABRICADA 

A primeira teoria da conspiração que te trago é das mais faladas, tendo até sido alvo de manifestação no Rossio - não fossem as pessoas inconsequentes e irresponsáveis. Então, diz-se por aí na deep web que o vírus foi criado propositadamente por um laboratório na China ou na Rússia (sítios bastante semelhantes e facilmente confundíveis) e serve de arma química para chantagear os Estados Unidos ou até mesmo para controlar a dimensão populacional. É nestas situações em que me questiono sobre onde estará a miúda do cartaz "Não Matem Os Velhinhos". Se a eutanásia para ela é tão maléfica, o que é que dirá acerca disto?

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TUDO POR JOE BIDEN

Já é sabido que o tirano do Donald Trump será substituído no próximo mandato por Joe Biden, muito graças aos votos dos norte-americanos que, sabe-se lá como, ganharam dois dedos de testa. Porém, há quem acredite que o vírus foi criado de forma a que o Dorito presidencial perdesse as eleições - sendo expectável a sua péssima gestão. Óbvio que, para se vencer uma campanha eleitoral, não há nada melhor que invocar uma pandemia causadora de milhares de mortes, não é?

A CULPA É DO BILL GATES

O que te vou contar a seguir já não deve ser novidade e, para quem acredita, tem mesmo aquele toque de Illuminatti. Um dos nomes mais colocados em cima da mesa no que toca à pandemia em que vivemos é o de Bill Gates que, numa Ted Talk em 2015, afirmou que a humanidade seria facilmente abalada caso surgisse qualquer tipo de surto, nunca especificando se seria ao nível da saúde, da economia ou de outro setor. Os anos passaram, o vírus chegou e houve quem quisesse começar a fazer contas e a comparar discursos de multimilionários. Foi o que aconteceu, dando origem a este rumor.

E como um mal nunca vem só, há também quem acredite que o bicho tenha sido desenvolvido no laboratório que a sua fundação financia, dando-lhe a patente sobre a doença, uma cura antecipada e, com a potencial vacina, a possibilidade de inserir microchips nos seus utilizadores, de forma a controlar o mundo. Eu duvido que Bill Gates seja um santo, mas também não acredito que ele tenha a maldade do Megamind.

SPRINGFIELD SABIA PRIMEIRO

Gostava de um dia escrever um texto com o top de previsões que "Os Simpsons" já acertou. Todavia, nesta conjuntura venho mesmo só falar dos episódios "Marge in Chains", de 1993, e "The Fool Monty", de 2010. Na verdade, esta teoria não passa de um misto de photoshop com uma pitada de racismo.

No desenho animado, mais propriamente no episódio dos anos '90, dois trabalhadores asiáticos espirram para uma caixa, mais tarde transportada para a terrinha dos nossos amigos amarelos e que provoca uma epidemia. Contudo, esses trabalhadores são japoneses, oriundos de Osaka, não havendo qualquer correlação à cidade chinesa de Wuhan. Se tudo não passou de um equícovo fora de contexto? Eu acho que sim.

Relativamente ao cenário de 2010, houve só aquela manipulação de imagem marota. No caso, o pivot Kent Brockmant estava a falar do "Apocalypse Meow", não da COVID-19. É um facto que esta série dá muito que falar no que toca às suas previsões macabras, mas desta vez não passou tudo de fruto da imaginação alheia.

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VÍRUS ESPACIAL

E quando também surgiu a ideia de que o SARS-CoV-2 veio num meteorito que atingiu a China em outubro de 2019? Vai na volta e era o Principezinho que estava a tentar fugir de casa - mas a coisa deu para o torto.

AS DROGAS PESADAS, UM FRASCO DE DESINFETANTE E XIXI ENTRAM NUM BAR

Acreditava mais depressa que o trio "Cocó, Ranheta e Facada" nos protege do vírus do que a cocaína, o álcool e a urina de vaca. Parece uma loucura, eu sei, mas existe mesmo gente que acredita que estas substâncias são a chave para combater a pandemia que enfrentamos. Ora, claro que é fake news, mas o que se dizia por aí era o seguinte:

A cocaína protege os indivíduos porque limpa o interior do nariz.

O álcool metílico, também conhecido como metanol, quando injetado, purifica e desinfeta os corpos.

Beber urina de vaca cura doenças, nomeadamente a SARS-CoV-2.

Pois... Já deves estar a calcular qual o feliz resultado obtido por quem decidiu enverdar por estes caminhos. Spoiler alert: falecimento.

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Não sei quanto a ti, mas eu, que achava que tinha um parafuso a menos, até me senti mais "normal" ao perceber que, apesar das minhas idiossincrasias, não caio neste tipo de conspirações. Acaba até por ser contraproducente alinhar nestas coisas porque só vai fazer com que rememos contra a maré e prejudiquemos quem realmente trabalha para nos ajudar. Claro que estas teorias são alvo de gozo e só merecem isso, contudo não nos podemos esquecer que quem se manifesta e age contra as recomendações da DGS e da Organização Mundial de Saúde só contribui para a sobrelotação dos estabelecimentos hospitalares, resultando em profissionais exaustos e num aumento exponencial do contágio, fazendo com que a crise em que vivemos não encontre uma data de término.

Não são tempos fáceis, é um facto. Mas poderão ser mais breves se trabalharmos em conjunto e ajudarmos da melhor forma possível. É desgastante ter de ficar em casa a toda a hora, usar uma máscara na rua que mais parece que nos vai sufocar, não poder dançar noite dentro com conhecidos e desconhecidos, não poder estar com os nossos amigos no café, não poder abraçar os nossos avós e receber aquele calor que só eles sabem dar. É normal que estejamos cansados das notícias, de ver desgraça a toda a hora, de lutar constantemente contra os nossos instintos que chamam tanto o toque. Mas é para um bem maior. 

Um dia, iremos ler sobre isto nos livros de História e temos o poder de escolher de que lado queremos ficar: o dos úteis ou o dos que não ajudaram em nada. Em qual deles é que estás?

O belo do não tão belo elogio

11.11.20, Lástima

Eu amo conduzir. Toda a sensação de estar a dominar o volante e a comandar um carro deixa-me com borboletas na barriga e, além de me permitir estar sozinha a cantar aos altos berros sem prejudicar os ouvidos dos que estão à minha volta, também me dá espaço para aprimorar o meu lado filosófico, libertando o Immanuel Kant que tenho dentro de mim. Posto isto, podes assumir que tenho vários momentos de divagação quando estou sozinha no carro. E hoje, fiquei com vontade de partilhar um deles, nomeadamente sobre a pressão do elogio.

Ora, eu sei que escrever sobre o ato de elogiar tem muito pano para mangas, mas o foco que eu queria dar à coisa é o seguinte: nem todos os elogios têm de ter segundas intenções. Sinto que, a cada dia que passa, deixa de haver a possibilidade de espalhar amor e palavras simpáticas ao outro, seja por medo de ser mal-interpretado ou por outro motivo qualquer. E isto deixa-me inquieta - então, se eu quiser dizer a alguém que é bonito, tem estilo ou é engraçado serei logo vista como promíscua porque só estou a flirtar? Quando é que um elogio passou a ser automaticamente sinónimo de engate? (Claro que esta reflexão não tem nada a ver, nem pouco mais ou menos, com os piropos - o universo dos comentários desnecessários e porcos mascarados de "coisa inofensiva" não é para aqui chamado.)

Mas custa-me ter de ver maldade em tudo. Por que é que alguém dizer que tenho jeito para a escrita ou que acha piada ao meu blog é traduzido como um pretexto para me tentar seduzir? Se eu elogiar os quadros de um artista, estarei a tentar engatá-lo? Claro que não. Custa-me ver que vivemos num clima de desconfiança tal que toda e qualquer simpatia é logo vista como uma máscara para algo mais - porque espalhar boas ações pelo mundo fora já não é suficiente; tem de haver, sempre, mais alguma coisa.

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Aliás, até vou retificar: nem todos os elogios são vistos como tentativas de sedução. Muitas vezes, são interpretados de forma sarcástica - tal não é a anormalidade ao elogiar alguém, que passa logo a ser traduzida a alguma provocação irónica e mal-intencionada.

Estes padrões duplos em relação a algo que poderia ser tão fofo e simpático acabam por criar um estigma um tanto ou quanto parvo que impede as pessoas de dizerem o que sentem sem se auto-censurar. Até acabei por debater este assunto com uma pessoa próxima e ela alertou-me para o facto de haver sempre alguma coisa que impede um elogio de ser visto com sinceridade aos olhos dos outros, seja porque um homem elogiar outro é considerado pouco másculo ou porque uma mulher elogiar outra parece falso. Porquê? Por que é que a atribuição de elogios tem de ser sequer condicionada pelo género da pessoa que está a elogiar?

Talvez seja eu que passo demasiado tempo a filosofar no carro, mas esta é uma questão que me aflige. Sinto que o mundo se está a tornar num lugar demasiado sombrio e sempre em busca do pior do outro, cujo clima de desconfiança e desprezo transforma a mais pequena boa ação em algo potencialmente maléfico. Estarei a exagerar ou consegues ver algum fundamento nesta minha hipótese? Diz-me tudo o que pensas na caixa de comentários que eu mal posso esperar para saber a tua opinião!

Diário de bordo de uma recém-chegada

episódio 1

04.11.20, Lástima

Confesso que, no alto da minha mente pseudo-sábia, queria, em setembro, escrever-te um texto sobre o meu ano sabático antes de ir para mestrado. Contudo, e tendo em conta que este blog é feito das minhas histórias lastimosas (infelizmente ou felizmente reais), está na hora de passar ao primeiro episódio deste diário de bordo na vida de uma recém-licenciada, recém-chegada ao mercado de trabalho e, de momento, recém-desempregada. 

Isto de arranjar trabalho no meio de uma pandemia mundial não é nada fácil, admito. Na verdade, estava à espera de ter dificuldades porque sou um peixito neste profundo oceano cheio de baleias assassinas e tubarões, mas não sabia que entrar na vida laboral seria tão absurdo. Por isso, hoje trago-te três histórias que marcaram o meu mês de outubro e que te podem alertar sobre algumas armadilhas que este mundo esconde - pelo menos para mim, que comecei esta jornada demasiado ingénua.

Antes de começar com as histórias, faço a ressalva de que a minha busca tem sido virada para o mundo da comunicação, pelo que esse é o único conhecimento de causa que tenho. Além disso, irei manter o nome das entidades em privado que isto não é para levar com processos em tribunal. Agora que já fiz os avisos que precisava de fazer, 'bora ler as desventuras que me esperavam?

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A EMPRESA PRIME QUE NÃO SABE OUVIR UM "NÃO"

Ora vamos lá começar. Era uma vez uma jovem de 21 anos que, até à data, sabe ler. Durante a sua procura ativa por emprego na área de formação, encontrou um anúncio que dizia "Procuramos jovens licenciados em comunicação, comunicação social e ciências da comunicação para fazer parte da nossa equipa". Ela, toda cheia de fé, pensou que tinha acertado na muche e lá se candidatou. No espaço de dias, recebeu uma chamada do recrutador, que se mostrou interessado e marcou uma entrevista para a segunda-feira seguinte. (Portanto, só para situar, tens aqui uma lástima esperançosa sobre a sua vida profissional, baseando-se no anúncio a que se candidatou.) 

Chega o dia D e ela aparece na sede da empresa. Era numa zona toda chique de Lisboa, o que a deixou logo a pensar que iria trabalhar com gente fina. Entra no local, senta-se na cadeira da sala de reuniões e é logo elogiada por tudo o que já tinha feito durante a sua curta jornada na área. "Pode ser que me safe", foi o que ela pensou, acreditando que seria chamada a pertencer à equipa de comunicação da dita cuja. Estava a correr tudo muitíssimo bem quando o recrutador decide ser claro e confessa que, na verdade, o que ele quer é recrutar agentes imobiliários com boa capacidade de comunicação, não pessoas formadas na área para exercer aquilo ao que vinham.

Ela, ao dar conta que tinha sido enganada à grande e à francesa, pediu para dar uma resposta final mais tarde, tendo sido acordado que na quarta-feira mais próxima iria dar o seu veredicto. Chega o dia, o senhor liga, ela recusa educadamente e, como prenda de Natal antecipada, ainda leva com uma reprimenda dele por estar a "desperdiçar o seu talento" e que, dentro de 3 meses, lhe teria de ligar a pedir desculpa porque iria continuar no desemprego. Alguém não está habituado a levar tampas, pois não?

UMA MULTINACIONAL QUE NÃO SABE O QUE É MARKETING

Esta história aqui é quase igual à primeira - só muda o nome da empresa e a função mascarada. Desta vez, encontrei uma oferta de emprego que dizia "Procuramos membros para reforço de equipa no departamento de marketing". Parece bastante claro, não parece? Bem, lá fiz a candidatura e também recebi uma chamada a marcar entrevista que, curiosamente, aconteceu no dia seguinte à da história anterior.

Receosa de ser mais uma vez enganada (considerando como tinha sido a minha última manhã), inspirei fundo e rezei aos anjinhos do mercado profissional que me abençoassem com uma oferta de emprego. Foi desta forma que eu percebi que alguém me há-de ter lançado mau-olhado - porque, mais uma vez, o anúncio não correspondia à vaga. Agora, era suposto eu vender instrumentos para a casa das pessoas - uma espécie de porta-a-porta mas com algumas adaptações face o vírus. Contudo, quando recusei a generosa oferta de ir para a casa de desconhecidos e poder contrair uma doença infecciosa, ninguém me deu um raspanete. Menos mal.

O ÚNICO TRABALHO PARA O QUAL ME ACHAM INTERESSANTE E EMPREENDEDORA

Por fim, vou tocar num tópico que acredito que muitos já viveram: o dos esquemas em pirâmide (ou marketing multinível, vá). Acredito que não seja a única, mas sinto que tenho um íman para atrair colaboradores destas ricas empresas que pretendem, como é óbvio, o bem da comunidade e não são uma espécie de máfia organizada. Já os apanhei no Facebook, no Instagram, no Twitter e até no LinkedIn, por isso venho fazer o meu serviço comunitário do mês e escarrapachar o modelo de mensagem que costumam enviar.

A sequência é simples. Começam com um "Olá, tudo bem?" e passam para uma análise do teu perfil (que indica que, independentemente de quem fores, és sempre super interessante, proativo e empreendedor, como é óbvio de perceber através de um story onde foste comer crepes). De seguida, dizem que fazem parte de um projeto mesmo inovador para Portugal e que, além de nos oferecer imenso dinheiro - quase tanto quanto o que está no cofre do Tio Patinhas - também nos permite abrir horizontes e ser a nossa melhor versão. Depois, há sempre o típico convite para café (que agora, dadas as circunstâncias, é uma videochamada) para veres a apresentação mega deslumbrante que têm para te mostrar. Ah, e claro, resistem em dizer o nome do projeto ou da empresa para não ires pesquisar e ver que... digamos, é peta. Se calhar sou eu que sou descrente, mas parece-me que a bota não bate com a perdigota.

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Com isto, e para concluir esta epopeia de desgraça, queria só deixar uma nota positiva porque acredito piamente que tudo acontece por uma razão e, se a minha ocupação profissional ideal ainda não chegou, mais vale aproveitar as minhas peripécias na sua busca e transformá-las em algo minimamente engraçado (há que tirar algo positivo de tudo, não é mesmo?).

Se, por outro lado, tu que estás a ler isto pertences a uma empresa que acha que precisa de uma lástima com pernas na sua equipa, não hesites em mandar e-mail que eu responderei atenciosamente (e com um pingo de desespero, convenhamos).

Para quem já não é novo nestas andanças, pergunto: que momentos caricatos tens enquanto procuravas trabalho? Tens algumas dicas para mim?

Para quem só se quer entreter com o que escrevo: não percas o próximo episódio, que eu também não!